domingo, 20 de março de 2016

SÉRGIO MORO E O "COMPLEXO DE NICHOLAS MARSHALL"


No início dos anos 90, se não me falha a memória, havia um seriado americano de televisão chamado no Brasil de “Justiça Final”. Nele o protagonista, juiz e ex policial Nicholas Marshall, era um homem frustrado com o sistema jurídico porque a tecnicidade da lei o impedia de “fazer justiça”. Ele fazia uma clara distinção entre servir ao Sistema e servir à Justiça. Para julgar seus réus segundo o que achava ser o melhor para a sociedade, à luz da Lei, mas driblando a burocracia, a corrupção e os vícios do sistema, Marshall adotava um procedimento: quando deixava seu gabinete ou tribunal, vestia-se formalmente com calça jeans e jaqueta de couro, cabelos despenteados, e saía para a rua. Frequentava os lugares mais perigosos da noite, os becos suspeitos e escuros, enfim, o ambiente onde seus perigosos investigados praticavam crimes. Como um simples cidadão ele podia se infiltrar no mundo do crime e resolver os casos à sua maneira.
            O juiz federal Sérgio Moro se parece muito com o modelo de magistrado dotado do “Complexo de Nicholas Marshall”, termo cunhado pelo jurista Alexandre Morais da Rosa para identificar o juiz que atua como um vingador social. Se bem que no caso de Moro poderíamos usar o termo vingador político. E não é difícil perceber a origem da sua frustração de juiz de gabinete: no Brasil, em especial, na nossa democracia, a relação Estado-Capital é muitas vezes cancerosa, nociva, sujeita à corrupção. Moro deve ter acompanhado o processo da Operação Satiagraha, da Polícia Federal (entre 2004 e 2008, aproximadamente) e o seu destino infeliz. Essa operação – que investigou ações ilícitas do empresário Daniel Dantas e de seu Banco Opportunity, desde o Governo FHC até o Governo Lula – ocasionou a exposição do Judiciário brasileiro como poucas vezes se viu: o conflito entre o juiz federal Fausto de Sanctis (que cuidava do caso) e o então presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, que de modo suspeito julgou a favor de Dantas e em prejuízo da Polícia Federal e do juiz Fausto de Sanctis, levando ao arquivamento das investigações e deixando no ar o fantasma da injustiça.
            Além disso, o próprio Moro já declarou que se inspirou na Operação Mãos Limpas, do judiciário da Itália, como seu método de fazer justiça. Assim como a operação italiana, a Operação Lava Jato convoca a máquina midiática para ganhar a atenção da opinião pública e deixar os envolvidos “em maus lençóis” publicamente. Assim ele espera encontrar atalhos no mecanismo de punição a criminosos dos altos escalões da política, de estatais e de grandes empresas privadas.
Contudo, é preciso lembrar que o juiz Marshall da ficção era um ex policial e portanto seu recurso (as ruas, a noite, os becos) não são totalmente estranhos a ele. Quando tira a toga e veste a calça jeans, ele sabe que está assumindo um outro lado que ele conhece bem. Mas no caso do nosso Marshall brasileiro, seu recurso para driblar o sistema é fazer uso da histeria da massa. Para obter sucesso na sua empreitada ele teria que ter domínio sobre esse universo. Do contrário, ao bater o martelo, ele pode até derrubar um Governo, mas não derrotará sua maior inimiga: a corrupção sistêmica.
Pela articulação de partidos e políticos em face de um possível impeachment da Presidente Dilma, se nota que estão sendo tomadas as providências em nome da tomada e manutenção do poder. Velhos jogos tendem a manter os mesmos jogadores. E aqueles que estão indo às ruas mostrar sua revolta com a corrupção tornam-se joguetes nas mãos desses políticos que, descaradamente, estão arrumando o terreno para tomar posse assim que ele estiver desocupado.

Joguete... É a isso que pode estar destinado o papel dos que pedem o fim da corrupção. As vítimas salvas pelo herói fictício Marshall estão longe de representar as vítimas da corrupção do herói Sérgio Moro, pois ele mesmo já se tornou vítima do seu próprio método. Quando as ratazanas de Brasília não precisarem mais dele, enterrarão seu nome como um traidor, charlatão ou qualquer coisa que seja desprezível aos olhos da massa. 

Um comentário:

  1. Lembro bem do Juiz Marshall, e sua comparação foi muito apropriada, assim como o desfecho infeliz que você prevê para o Juiz Moro. O Juiz Marshall lutava contra um sistema jurídico técnico que, embora moroso pretendia chegar a um final justo, enquanto o Juiz Moro luta contra um sistema político desvirtuado, um Congresso pervertido, uma mídia tendenciosa e um povo burro e tão corrupto quanto os próprios políticos que ele elege.

    ResponderExcluir