segunda-feira, 27 de agosto de 2012

OLHO DE VIDRO - parte VI



                Enquanto leio OLHO DE VIDRO, de Márcia Tiburi, vou tentando imaginar um telespectador ideal. Não gosto muito de ser idealista, mas enfim... volta e meia me descubro assim...
                Um telespectador ideal  seria... alguém que conseguisse regenerar e multiplicar seu olho quando esse olho é comido pela televisão. O olho regenerado e multiplicado será sempre alvo da fome da televisão, por isso ele deve se manter atento... atento a si e à televisão.
                Mas, falemos do livro. Li o capítulo chamado “VIDEODROME  - O VÍDEO E A CARNE”. Bom, se o raciocínio de Márcia Tiburi nesse livro sobre televisão já nos oferece uma visão com um tempero um tanto exótico, imagine um capítulo onde a autora traz à baila o cineasta canadense David Cronenberg, que assina o filme “Videodrome” (1983). Cronenberg, por si só, possui  um gosto pelo tema que eu costumo identificar como a deterioração do corpo. Seus filmes são perturbadores porque ele descobre doenças corpóreas que a gente não imagina. Na verdade, acho que as doenças criadas por Cronenberg não podem ser classificadas como tal, porque ele sugere – pelo menos nos dois filmes seus a que assisti: “A mosca” e “Gêmeos, mórbida semelhança” – uma contemplação da anomalia ao invés da cura...
                Nesse capítulo Márcia vai ao extremo da sua proposta de adotarmos a televisão como um olho artificial. Ela se apoia no filme de Cronenberg para clarear sua teoria  na qual temos “a relação orgânica, o novo corpo, daquele que, sem ser sujeito, permanece sendo corpo” (pag. 115), corpo que se capacita para ser depositário de um discurso.. . Ora, se podemos entender o conhecimento como resultado da nossa sensação do mundo através dos sentidos, então temos que admitir o corpo como instrumento político (Foucault saberia como argumentar sobre isso melhor que ninguém).           
Esse corpo, submetido a uma transformação em máquina (o novo corpo), carrega em si o histórico de captar o mundo pelos sentidos. Mas a máquina, injetada no corpo pensante, contém em si também um pensamento...  alheio ao corpo que recebe a injeção da máquina. Temos aqui um sujeito disforme!... Ou então temos a eliminação do sujeito, já que a realidade produzida para o sujeito pode destruí-lo e já que ele se perde entre a realidade e a alucinação. Não resta dúvida de que Márcia Tiburi quer chamar a atenção para a subjetividade, malograda, do corpo, cujo olho já foi “comido”.

domingo, 5 de agosto de 2012

Olho de Vidro - parte V



                No capítulo “Fome de Olho”, Márcia Tiburi faz uma interessantíssima colocação do conceito de inveja, para dar continuidade ao argumento da atratividade da televisão. Vejamos se consigo resumir aqui essa ideia um tanto complexa.  Márcia explica que “Ver nos dá uma informação exterior sobre a coisa. A inveja é o contrário.” (pg 106). A inveja consiste em querer comer  o que é visto, no sentido de que o que é visto apresenta objetos que serão divididos entre o que será tomado para mim e o que será descartado, jogado fora.  A Invidia seria o excesso do ver.
                A ação de tomar para si está muito próxima da ação da eliminação. A inveja é a confusão entre devorar e eliminar aquilo que quero devorar. Ou devorar aquilo que quero eliminar.
                Desse processo apossou-se a tecnologia, que cuida de oferecer ao olho o que ofereceria a um olho artificial: um objeto programado para ser devorado.  O olho artificial – o olho de vidro – é observador e observado ao mesmo tempo.
                Ao que parece a teoria quer nos fazer crer numa ação televisiva enquanto isolamento do ver-total. O que chamo de ver-total é o que nossos olhos veem fora do propósito televisivo, embora eu concorde que nosso olhar, alheio à televisão, ainda carrega em si componentes do olho de vidro, pois nossa cultura não sobrevive sem a televisão. “Quando falamos de televisão não se trata de uma caixa preta no sentido da fotografia, mas muito mais a caixa de Pandora do Espetáculo” (pg 110).
                Estamos nos aproximando, assim, do que quero “devorar”: a política por trás do aparelho de TV. Pois o que parece meio óbvio ganha mais força quando sustentado por uma observação filosófica. Assim acredito...
                O capítulo ainda não acabou. Tenho que continuar lendo... No momento em que estou parando Márcia fala da decisão de ver do sujeito. E que tal decisão é paralisada pela televisão. Acho que estamos diante de uma batalha que envolve câmera e tela.