sexta-feira, 14 de maio de 2010

O romance terá sua publicação via blog interrompido aqui.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

o discreto tumulto

Diário de Estefânio Marchezini

29 de julho de 2005

Algumas vezes me animo em discussões em que alguém cita meu futuro. Me animo porque a simples pronúncia da palavra futuro me lança nele pelo menos na mente de quem a pronuncia. Imagino o que se projeta para mim e sobretudo sobre mim. Gostaria de conhecer o amanhã só para ter certeza de que o agora é real.
Entre meus esforços para me envolver com o mundo surgem experiências estranhas que me soam extravagantes demais. Penso que se o crescimento é tão confuso assim, como vou saber o momento certo assumir a maturidade?
Meus gestos são tão precisos, meu silêncio é tão cômodo. É impossível que alguém perceba a loucura dos meus dias, a sensibilidade dos meus nervos. Ninguém imagina o que para mim é mais que óbvio: que a qualquer segundo posso desaparecer como a imagem de uma televisão ao ser desligada. Meus dedos vivem com as extremidades protegidas por esparadrapos e quando alguém pergunta por eles, eu invento que é uma forma de me evitar roer as unhas. Todos acreditam nessa história, nem imaginam que os esparadrapos foram colocados para estancar o sangue dos pequenos cortes que eu provoquei voluntariamente só para ver meu sangue escorrer como se, com ele, também estivesse escorrendo alguma impureza da qual eu quisesse me livrar.
Juízos, possibilidades, pretensões, dúvidas, certezas e até amores surgem em forma de penumbras apenas, a todo instante, quando eu menos espero e sem que eu tenha tempo e cabeça para captá-los. Brincam com a minha vulnerabilidade ao entusiasmo, recolhem meus impulsos de qualquer jeito, fazem deles uma festa onde eu, convertido em anfitrião, tento acreditar que posso domá-los. Quando dou por mim, estou sonolento, embriagado pelo êxtase da festa; mas não quero dormir; quero seguir pela noite dançando com todos os fantasmas presentes, quero sentir a intensidade de cada um, quero abraçá-los. Todos, no entanto, se mostram fugidios como o galho da lucidez em que tento me agarrar a cada final de festa.
Ainda há quem se atreva a falar em seriedade quando se trata de vida!