sexta-feira, 9 de março de 2012

O CONSTANTE SUSSURRO


Uma voz, um sopro, um incômodo constante. Essa cobrança que nunca se satisfaz; essa voz exigindo sempre mais, mais uma palavra, mais um título, mais um combate, mais um confronto... E a cada finalização a voz murmura que “ainda não é bem isso”.
Escrever é atender a esse eco maldito, insaciável. Atender a essa voz sem dono é conspirar contra os donos das horas. As horas perdidas com tão pouco fazer... são as horas que faltam para compor a forma do sentir, do pensar. É preciso recuperar o tempo e compor, moldar, registrar, organizar em palavras e frases o que a voz sem rosto exige.
Às vezes penso nos meus textos que deveriam ser abandonados sem acabar por serem obscuros mesmo para mim. Mas logo vem à minha frente algo que aponta uma pequena brecha de entendimento ou uma luz que revela, de relance, o que eu estaria perdendo se abandonasse aquele texto. Então volto a me concentrar nele. Dou-lhe mais uma chance de me ensinar o que há dentro de mim, por trás do que crio. Quem é Dani Scarpini? O que você quer de mim? Que maldição é essa? Por que esse jogo? Que você é um jogador eu já sei. O problema é que você mesmo não sabe disso. Cabe a mim lhe mostrar como jogar, com quem jogar...
Dani transporta uma visão política (que eu já nem sei se devo chamar assim: “política”) absolutamente obscura. Ele é capaz de mudar as coisas, conhece seu poder, à sua maneira... Porém, falta-lhe o método. Ou será que seu problema é justamente não querer conhecer o método?... Mas por quê?... Por que renunciar ao poder de mudar as coisas? Será medo? É por medo, Dani Scarpini? Mas como?!, se até o momento, concluída a primeira parte do Romance, Dani conseguiu enfrentar o medo de um desconhecido, e foi além, submetendo-se a outros desconhecidos, a outros desafios... Talvez tudo isso não tenha sido suficiente para ele crescer a ponto de assumir seu poder, o poder que lhe cabe por natureza... já que, aos olhos dos outros, não apresenta nenhum sinal de autoconfiança.
Os caminhos que me levam a Dani Scarpini são diferentes daqueles que me lavaram a Elídio Patrezzi. Ambos se parecem em algumas coisas, mas com Elídio eu sempre tive mais facilidade de lidar porque havia mais clareza no seu propósito. Criei-lhe uma teia de relações que funcionaram harmonicamente para compor sua evolução no enredo. Acho que obtive sucesso na conclusão de “A Performance”. O romance ficou leve, suportável... talvez com excesso de análises por parte de Elídio; mas até isso foi necessário para que ficasse clara a dimensão do seu choque com uma realidade que ele se esforçava para sufocar.
Recentemente nasceu Giogan. Não é o mesmo de “Poênia”, meu primeiro e tolo livro que fala de uma guerra civil fictícia. O Giogan de agora é outro. Como sempre tem algo parecido com os outros personagens meus. O que eles normalmente têm em comum? Um certo desdém com a própria vida, uma apatia crônica. Parece terrível fazê-los viver, caminhar, falar, agir... Mas se eu não cuido dessa gente...

Na foto, escultura de Auguste Rodin

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