segunda-feira, 23 de julho de 2012

olho de vidro - parte IV


Dando continuidade ao capítulo “Mirabilia”, do livro OLHO DE VIDRO, de Márcia Tiburi, vamos entendendo a dimensão do poder que uma imagem exerce no olhar ao cativá-lo pelo fascínio.  Ao mirar um objeto, consequentemente passo por uma construção, uma afirmação. A televisão, enquanto momento técnico na história do olhar, promove essa afirmação segundo  seu método.
            Vou me permitir uma ironia, uma brincadeira: Este capítulo é até agora o que mais me fascina...
Por uma razão simples: aqui a teoria vem de encontro a uma questão que há anos me inquieta. Quando penso no processo histórico da dessacralização (processo no qual o sagrado deu lugar à razão), inevitavelmente penso na manutenção política à energia que antes se destinava ao sagrado. Acredito que o sistema de articulação pensar-sentir (que talvez corresponda àquilo que Márcia cita como uma “lógica do olhar”), possa ter sofrido um desvio, um desvio de direção, mas não de natureza...  O que antes era reserva para o sentimento religioso, no sentido da glorificação pela admissão do “ser superior”, talvez possa ter cedido essa energia para o mesmo mecanismo onde, no lugar do divino e da magia, se posicionou o incrível. Assim, para posto do incrível foi sendo eleito aquilo que conseguisse garantir a permanência da reserva emocional que se legitima quando em proporção de massa.
Mas voltemos a Márcia Tiburi...   No método atual, no método técnico, essa manutenção do desejo (ou aquilo que chamei de energia), a televisão providencia o sentimento de verdade... O olho se prende à imagem proporcionada pela televisão porque ela lhe oferece a ideia do real na qualidade de um real desejado, logo, uma alucinação, no modo exposto por Freud em “Luto e Melancolia”.  Nesse trabalho Freud define a melancolia como uma perda parecida com o luto (absorção do Eu onde a perda é consciente), porém mais enigmática e inconsciente porque nela o Eu passa por um processo de empobrecimento e esvaziamento.  Portanto, eu diria que  Márcia nos informa o caráter patológico do ver-televisão. O olho deseja e busca algo que preencha o vazio do rosto, aquela cavidade onde ele, o olho,  deveria se instalar. Mas esse olho construído para ocupar um vazio, por ser um olho de vidro, artificial, requer uma imagem que também corresponda ao  real, porém um real construído, artificial, mais apropriado ao desejo de quem olha.  Lembrando Giorgio Agamben em “Homo Sacer, O Poder Soberano e a Vida Nua”, Márcia diz que “A atitude do telespectador diante dela (a televisão) – e sob seu regime – não poderia ser outra do que a do melancólico” (pg 97).
O fato é que essa alucinação televisiva consiste na relação do olhar com o visível. Mas essa relação ainda está, para mim, um pouco tumultuada. Espero que nas próximas páginas Márcia me esclareça algumas coisas, principalmente as coisas relacionadas ao sujeito e ao objeto dentro dessa relação. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário